Cinco animais que foram reintroduzidos à natureza há dois meses continuam sendo monitorados
Há
dois meses acompanhei, a convite da Petrobras Ambiental e do Instituto
de Pesquisa Mamirauá, a soltura de cinco peixes-bois que viveram quase
toda a sua vida em cativeiro. Resgatados em diferentes circunstâncias
(leia a história aqui)
e condições dramáticas, os animais tiveram uma nova chance de viver a
partir dos esforços dos moradores das comunidades ribeirinhas
localizadas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã e dos
pesquisadores do Instituto Mamirauá.
Fiquei
três dias hospedada em um barco de linha à beira do Lago Amanã,
afluente do rio Solimões, na divisa dos municípios de Tefé e Maraã. Foi a
oportunidade que tive para conversar com os moradores das comunidades e
com os cientistas e profissionais que eram verdadeiros “pais e mães”
dos peixes-bois.
Havia
dois grupos de peixes-bois. Em um deles estavam os cinco animais
prestes a seguir na nova jornada pelas águas que ficavam em um
curralzinho no meio da água (tem foto neste texto). Desta forma, eles
iam se acostumando com o habitat natural.
Outros
dois peixes-bois, mais ou menos filhotes, diria adolescentes (Japurá e
Helena), permaneciam na piscina artificial, se alimentando de vegetação
aquática e leite com vitaminas. O momento da mamada era uma ternurinha
só. Até eu, não muito dada a tatibitatis e guti-gutis, fiquei
enternecida.
O
pessoal do Mamirauá desenvolveu uma mamadeira própria que permite o
animal beber o leite dentro d´água. Um invento muito apropriado porque,
desta forma, a se assemelha à mamada natural no seio da mãe.
Lágrimas
Agora
eu vou falar. Me deu vontade de chorar enquanto testemunhava os
preparativos da soltura. Ficava enchendo o saco dos moradores das
comunidades que colaboravam com os pesquisadores. “Mas e se eles se
perderem? Se eles não quiserem ser soltos? E se ele não se acostumarem
com a nova vida? Se eles forem mortos”? Fiz essas perguntas meios tola
até para a Míriam Marmontel, projeto de Conservação de Vertebrados
Aquáticos (Aquavert) do Instituto Mamirauá.
Eu
não tive muitas respostas para essas perguntas emocionadas e um tanto
piegas. Na verdade, eu sabia que ninguém me responderia mesmo. Nem os
cientistas. Todos estavam muito concentrados, preocupados para que tudo
desse certo.
Claro
que todos sabiam que, ao longo de quatro anos, os trabalhos para ajudar
os animais na reabilitação foram extremamente sérios e realizados com
modelos científicos avançados. Os esforços para elaborar uma tecnologia
de monitoramento foram brilhantemente executados.
Mas
volto a afirmar. Me deu dó. Quando entrevistei uma das moradores da
comunidade fiquei novamente com os olhos lacrimejantes. Ela estava
feliz, mas com o coração apertado (foi a expressão que usou), pelo medo
de ter feito “um trabalho em vão”. “Sabe, eu preferia que eles
continuassem aqui com a gente”, comentou ela, pedindo para que essa
declaração não fosse publicada na matéria que fiz para o Jornal A
Crítica na época.
No
momento da soltura, num sol à pino de agosto, uma hora da tarde, aquela
expectativa. Quase uma hora no cercado de contenção para uma última
adaptação.
Lembro
que comentei com a Tatiane, assessora de imprensa da Petrobrás
Ambiental (que patrocina o projeto do Instituto Mamirauá): “E se eles
não quiserem sair?”. Por isso não foi muita surpresa para mim quando,
realmente, a gente esperou, esperou, aguardou e nada.
Os
animais continuaram circulando no cercadinho. Horas, muitas horas
depois eles começaram a fazer o reconhecimento. Descobriram que poderiam
navegar mais longe, explorar outras áreas.
Finalmente,
no início da noite, o último dos cinco peixes-bois se atreveu a sair do
cercado, para a felicidade (e, acredito eu, para a tristeza também) de
quem durante todos esses anos trabalharam para que estes animais
soubessem o que é viver em liberdade
Notícias
De
vez em quando eu pergunto do Augusto Rodrigues, assessor de imprensa do
Aquavert, cuja sede é em Tefé, as últimas notícias dos peixes-bois.
No final de agosto, logo após a soltura, o Augusto me enviou o seguinte email:
“A última informação que tive sobre a telemetria dos peixes-boi é que
eles ainda estão no igarapé do Juá Grande, mas não estão nadando juntos.
O Alagoilton é mais difícil de saber, já que não dá pra vê-lo debaixo
d'água”.
No final de setembro, recebi este outro email, mais detalhado:
“Eles
continuam sendo monitorados por duas equipes, nos turnos da manhã e da
tarde. As equipes estão conseguindo localizar os bichos. Em alguns dias,
os animais estão todos juntos, noutros ficam dispersos. Benguela, a
única fêmea, costuma nadar ao lado de Negão (eles já foram localizados
no lago Amanã, bem perto do Centrinho). Os animais estão se movimentando
bastante, mas ainda não percorreram uma grande área. A expectativa é
que eles passem o período da seca na área do lago Amanã e que, na cheia,
acompanhem a migração natural dos peixes-boi para a região de
Mamirauá”.
Nesta
semana, o Augusto me falou que o Instituto Mamirauá fará um sobrevoo
para tentar localizar o Jovenal. São essas as notícias. Vamos torcer
para que o futuro de Piti, Negão, Alagoilton, Jovenal e Benguela seja
de liberdade nas águas amazônicas.
Blog Elaize Farias
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